Friday, February 28, 2014

Eu sou o reflexo da busca do conhecimento nietzscheano de Jack...

1- Nós, homens do conhecimento, não nos conhecemos; de nós mesmos somos desconhecidos – e não sem motivo. Nunca nos procuramos: como poderia acontecer que um dia nos encontrássemos? Com razão alguém disse: “onde estiver teu tesouro, estará também teu coração”. Nosso tesouro está onde estão as colmeias do nosso conhecimento. Estamos sempre a caminho delas, sendo por natureza criaturas aladas e coletoras do mel do espírito, tendo no coração apenas um propósito – levar algo “para casa”. Quanto ao mais da vida, as chamadas “vivências”, qual de nós pode leva-las a sério? Ou ter tempo para elas? Nas experiências presentes, receio, estamos sempre “ausentes”: nelas não temos nosso coração – para elas não temos ouvidos. Antes, como alguém divinamente disperso e imerso em si, a quem os sinos acabam de estrondear no ouvido as doze batidas do meio-dia, e súbito acorda e se pergunta “o que foi que soou?”, também nós por vezes abrimos depois os ouvidos e perguntamos surpresos e perplexos inteiramente, “o que foi que vivemos?”, também “quem somos realmente:”, e em seguida contamos, depois, como disse, as doze vibrantes batidas da nossa vivência, da nossa vida, nosso ser – ah! E contamos errado... Pois continuamos necessariamente estranhos a nós mesmos, não nos compreendemos, temos que nos mal-entender, a nós se aplicará para sempre a frase: “Cada qual é o mais distante de si mesmo” – para nós mesmos somos “homens do desconhecimentos”...

2- Meus pensamentos sobre a origem de nossos preconceitos morais – tal é o tema desde escrito polêmico – tiveram sua expressão primeira, modesta e provisória na coletânea de aforismos que leva o título Humano, demasiado humano. Um livro para espíritos livres, cuja redação foi iniciada em Sorrento, durante um invernos que me permitiu fazer uma parada, como faz um andarilho, e deitar os olhos sobre a terra casta e perigosa que meu espírito percorrera até então. Isto aconteceu no inverno de 1876-7; os pensamentos mesmo são mais antigos. Já eram, no essencial, os mesmos que retorno nas dissertações seguintes – esperemos que o longo intervalo lhes tenha feito bem, que tenham ficado mais maduros, mas claros, fortes, perfeitos! O fato de que me atenho a eles ainda hoje, de que eles mesmos se mantenham juntos de modo sempre firme, crescendo e entrelaçando-se, isto fortalece em mima  feliz confiança em que não me tenham brotado de maneira isolada, fortuita, esporádica, mas a partir de uma raiz comum, de algo que comanda na profundeza, uma vontade fundamental de conhecimento que fala com determinação sempre maior, exigindo sempre maior precisão. Pois somente assim convém a um filósofo. Não temos o direito de atuar isoladamente em nada: não podemos errar isolados, nem isolados encontrar a verdade. Mas sim, com a necessidade com que um árvore tem seus frutos, nascem em nós nossas ideias, nossos valores, nossos sins e nãos e ses e quês – todos relacionados e relativos uns aos outros, e testemunhas de uma vontade, uma saúde, um terreno, um sol. – Se vocês gostarão desses nossos frutos? – Mas que importa isso à nós árvores! Que importa isso a nós, filósofos!...



(Genealogia da Moral [parágrafos 1 e 2] - Friedrich Nietzsche)

Thursday, February 27, 2014

Excelência: O decreto do Eu

Excelência, maldição nomeada. Caminho para a auto iluminação como para a auto destruição. Sucumbe à própria ponte engendrada, entre um dia e outro, cai junto dela, com ela. Desesperado, grita em cacofonias e rabiscos o que o Eu não suporta em sua caixa do ser.
O líquido viscoso corre garganta a baixo e pelas suas veias... ah, gosto de excelência.
Seja, crie, pense, faça.
Gritos de um ditador para o servo; ambos são apenas um. O ditador do servo é o mesmo servo do ditador. Pensar não é o suficiente, você tem que criar; criar não é o suficiente, você tem que ser bom; ser bom não é o suficiente, você tem que amar; amar não é o suficiente, você tem que ser bom... único... bom... excelente... NEGUE, AFIRME, NEGUE, LUTE, SANGRE, FAÇA SANGRAR, SEJA!
Como te permites sonhar se não podes serdes bom? Como podes se dedicar se não podes serdes bom? Como viverás sem serdes bom... único... bom... excelente, para o homem no espelho? Este homem, o homem no espelho, que me acusa, dia após dia, meu juiz e júri.

Há um portal em forma de delta com espinhos em seu contorno, aqui, bloqueando minha memória, meu acesso à algo; não é a primeira vez que me deparo com ele.
Responda! Entre! Risadas, soluços, e os dentes vibram batendo uns nos outros, numa globalização de angústias fundamentais oriundas de todas as heranças... o saber negado.
Segredos de um universo que decidimos intitular “realidade”; pseudo realidade. Uma parte material regida por uma parte imaterial, ao mesmo tempo dependente da parte material, nessa bioquímica cerebral cujo foco principal é a consciência. Ambas interdependentes de ambas. Algo por trás deste palco de neurotransmissores e hormônios, que interpreta o que é oriundo do plano externo ao mental, para dentro de si numa resposta física, química e biológica, que é expelida de volta ao plano externo ao mental. Imaterial apenas neste plano, material em outro, ao qual não temos acesso direto... apenas imaterial neste plano de realidade, o que escolhemos intitular realidade... como podemos ter tanta certeza de que esta é a realidade? Ou, interpretando permitindo-se ser limitado ao plano material que pertencemos, que esta é a única realidade?
Do outro lado... cujo mentes tentaram incessantemente interpretar, tanto analisando de forma externa, olhando ao redor, ao Macro, como analisando de maneira interna, olhando para o Eu, ao Micro... do Micro ao Macro. Tentativas que burlam o senso comum do que é e o que não é, baseado no conceito chave de que nada é o que é, e sim o que interpretamos, tudo é plausível de questionamento e revisão.
Quem conseguiu ouvir o inaudito, observar o invisível, transcender os limites impostos pela nossa realidade?
Arrisco alguns, todos com conflitos constantes, angústias penetrantes, vidas dignas, porém sofridas, que talvez só fizeram sentido naquele momento único que estamos, todos juntos, dignos e indignos, fadados: O Fim.
Seria justo talvez os mais dignos obterem este acesso à supra realidade ainda neste plano, ou seria insustentável pela lógica? Acessar uma realidade pertencendo à outra não parece fisicamente, mesmo “misticamente” se isso existisse, plausível. Então o mais provável, não necessariamente lógico nesta realidade, é que apenas ao deixar de pertencer à uma, nos tornamos capazes de acessar outra; no momento em que esta pequena parcela de imaterial que temos dentro de nosso (sub)consciente tornar-se material, real, finalmente.
Talvez o mais justo, e o que é mais provável de ser em ambas realidades, seja todos limitarem-se à esta realidade enquanto o organismo puder, e apenas em um outro plano imaterial à este, e material por ele mesmo, as diferenças do ser sejam edificadas.
Nada é o que é, e sim o que interpretamos. Existe o mundo aparente e o mundo real, e a este último não temos acesso.
Tenho certeza da dignidade dos questionamentos citados acima, mas ainda é interpretação. Sei da dignidade dos meus feitos, já realizados e principalmente vindouros, e também da limitação desta realidade; mas a limitação ainda é real e continuará sendo até o fim... glorioso fim, no qual transcenderei.
  
E eis que seu Eu decretou:
“Você é demais para si próprio.”