Você encontra-se
sentado olhando para o nunca, ouvindo Dvorak, e cada nota não é ouvida, mas
imaginada e ganha uma foto, um movimento, sentidos embaralhados, e você se pega
“vendo” o som, e não ouvindo-o. Um filme se desencadeia ao desenrolar da
sinfonia.
Inúmeras palavras surgem embaralhadas correndo na mente, e você desesperado
tenta pegá-las num pique-pega sináptico, aqui, ali! RÁ! Você consegue captar
algumas. O cobertor na cabeça... ideias e histórias povoam as suas entranhas, e
você para e pensa na complexidade de um simples ato de respirar, fazendo com
que suas hemoglobinas mudem de conformação para agregar o oxigênio e depois
jogá-lo por aí à dentro... milhares de moléculas se modificando de forma
complexa para receber de braços abertos o seu doce anti-herói, o oxigênio,
apenas para seu egoísta organismo viver... e então você respira fundo só pra
dar mais trabalho à elas.
E você só quer escrever, escrever e escrever e escrever, cada gota de
pensamento que lhe cai no rio fluente do consciente... mas nem tudo é
concebível ou faz sentido ou possui um valor lógico; mas o elixir absorve tudo,
é voraz e inconstantemente insaciável. Tudo, nada... melhor deixar pra depois.
Guarde tudo na rede chamada memória, depois selecione os melhores peixes quando
não estiver tão eufórico para pular no rio junto com todos eles.
Mas se bem que nadar com os próprios pensamentos deve surtir um melhor efeito
que ser um pescador dos mesmos... faz algum sentido? Pescar algo que está já
consigo? Até faz, se você parar pra compreender que o consciente e o
subconsciente são rios paralelos que só se encontram no desaguar ao mar, que é
a mente como o todo: uma sintonia inalcançável propositalmente; há muitas
portas fechadas.
Sorte que possuímos alguns aríetes bioquímicos, como este alcaloide magnífico,
elixir da inspiração, Ah...
Poder, aah... poder flui pela sua espinha num êxtase quase sexual; você quer
mais, mas está na sala acolchoada de sua mente, quer se libertar, mas na hora
imprópria; espere o horário do almoço onde você não estará mais na sala
acolchoada da consciência e do local no mundo real que se encontra agora.
Esfregando seus próprios ante braços e mexendo as pernas em pequenos ciclos de
abrir e fechar. Vira-se a cabeça de um lado para o outro inúmeras vezes. Numa
agonia que o faz perceber que você é sua própria camisa de força.
E a sinfonia de Pachelbel acaba... droga, vou repetir.
Ah... e o cravo de Chaconne in F minor volta a ecoar e saltitar nas minhas
visões, mais uma vez as notas ganham imagens e tornam-se um filme.
Parece que agora minhas hemoglobinas não tem mais tanto trabalho de se
endireitarem para receber o oxigênio... agora algo é diferente, e parece que
elas dançam uma valsa ao som desta sinfonia, carregando o oxigênio, e como que
trocando de par, contínua sua incessante valsa do respirar, que me mantém vivo,
pela sua dança. E por isso danço, sinto, vivo.
No comments:
Post a Comment